terça-feira, 29 de novembro de 2011

O irreversível e o inacabado de François Soulages


Entre os dias 21 e 26 de novembro, aconteceu na Universidade do Estado da Bahia o VIII Colóquio Internacional Franco-Brasileira de Estética: a Estética da Fotografia, fruto de uma parceria entre o grupo Retina (Recherches Esthétiques & Théorétiques sur lês Images Nouvelles & Anciennes) (Paris 8 – França), o Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais (Uneb) e a Escola de Belas Artes PPGAV (Ufba).
O professor François Soulages, presidente do grupo Retina, proferiu a palestra que deu início ao evento. A tradução foi feita pelo professor Alberto Olibvieri, presidente nacional do Retina e pesquisador do Centro de Pesquisa em Educação e Desenvolvimento Regional (CPEDR).
Soulages, um senhor calvo e simpático, iniciou sua fala elencando os três pilares da produção fotográfica que são essenciais para a pesquisa em fotografia: o sensível, o teórico e o estético.
A questão do sensível é a primeira que temos quando nos defrontamos a uma obra. Soulages nos explica que o homem é um ser de sensação e de significação e, assim, é receptor de sensações e formulador de significações.
Já a questão teórica é fundamentalmente necessária para a própria estética, pois libera o sujeito do subjetivismo e estabelece critérios para uma reflexão racional. É a teoria que nos leva a novas dimensões do objeto estudado.
A questão estética, por sua vez, é resultado de uma relação sensível que estabelecemos com o objeto. A antítese entre o teórico e o sensível é uma síntese da estética que é crítica, pois vai além das interpretações.
Após esclarecer estes três pontos, Soulages dividiu a conferência em três eixos principais: a estética, a estética das imagens e a estética da fotografia. A estética, para ele, tem três funções: descrição, julgamento de valor e problematização da obra. “Não é possível descrever de uma maneira neutra a obra”, afirma Soulages, “portanto, ou se tem consciência do preconceito, o que é positivo, ou se tem um discurso ideológico e subjetivo”. A estética não é dogmática nem afirmativa, mas está sempre aberta e, por isso, pode dar conta de fenômenos novos, como a arte digital. “A estética se enriquece e se transforma”, conclui.
Soulages conta que, quando se interessou por estética, a fotografia não era considerada arte e também não havia a imagem numérica (aqui, ele se refere à imagem digital). “Alguém limitado, portanto, não poderia compreender o fenômeno que se passa hoje. Desse modo, a estética não pode ser comparada à matemática”, arremata.
Sobre a estética da fotografia, Soulages afirma que a primeira pergunta que devemos nos fazer é: como fundamentar uma estética que seja rigorosa? Sobre o que iremos implementá-la? E responde: “Não pode ser sobre ela mesma, não podemos implantá-la sobre a questão do sensível, mas sim, sobre a questão teórica”.
Qual seria a técnica da fotografia, então? É aquela que aponta a especificidade da fotografia, ou seja, é a relação da fotografia com o real, e é a relação entre a foto e o real.
Sobre a relação entre a fotografia e o real, Soulages afirma que o objeto que fotografamos é um objeto em si mesmo e que um aparelho fotográfico só pode capturar um fenômeno particular, pois não é “uma quantidade de borboletas”, mas uma máquina que produz alguma coisa. Para ele, é a partir da matriz digital que a foto é falsidade.
A partir disso, Soulages trabalha com os conceitos de irreversível e de inacabado para explicar o conceito de fotogracibilidade. A fotogracibilidade é uma condição para a fabricação da foto, uma singularidade da fotografia. É uma relação entre a máquina e o produto.
Soulages alega que a fotografia é feita duas vezes. A operação da matriz é irreversível, pois o ato fotográfico também o é. No entanto, a partir dele, podem-se fabricar infinitas, pois o processo nunca está acabado.
A irreversibilidade é a perda do tempo e do ser que passou. Na fotografia, este ser nunca estará perdido e, por isso, ela nos faz imaginar. Na fotografia, estamos em uma economia do que é raro e, em outras palavras, ela nos dá algo que não é raro, mas que não existe mais.
Já sobre a relação entre o real e a foto, Soulages apresenta o conceito de “cada vez”. A fotogracibilidade se articula cada vez ou, explicando melhor, toda foto é uma foto de alguma coisa. Essa alguma coisa e o material fotográfico devem ser compreendidos sob uma perspectiva dialética, a partir das tensões e das contradições que os unem e os separam, pois formam a materialidade da fotografia. A estética do cada vez é a articulação entre o passado e o presente.
A fotogracibilidade é, portanto, a relação que surge entre o irreversível e o inacabado.
Sobre a estética da imagem, Soulages aponta que estamos em um momento-chave da história das imagens, pois, eis que surge a imagem que pode ser modificada infinitamente, em contraposição à antiga imagem fechada. Para ele, nós estamos em face de uma revolução das imagens, das artes da imagem e das artes, e a pesquisa estética deve compreender essa tríplice revolução e se apoiar tanto sobre o sensível quanto sobre o teórico.
Para finalizar a conferência, Soulages fez algumas pontuações importantes sobre a pesquisa científica. Entre elas, vale ressaltar a afirmação de que o verdadeiro interesse pesquisa deve ser as interrogações do mundo e da verdade e que, em si mesma, ela não tem sentido. Além disso, o conferencista fez uma elegante crítica aos pesquisadores, afirmando que “o espírito da moda e dos rebanhos, nada tem a ver com o da pesquisa. Nada pior do que seguir as vanguardas ou está preso ao passado. Para pensar o nosso tempo, é preciso ser do nosso tempo”.

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